segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Último texto do ano


Flor de uísque (ou homenagem a uma barata)

Quando eu era criança, perdi o meu pai. Quando eu era criança, brincava na terra vermelha do jardim de infância. Sujava minha roupa inteira, mas valia a pena, pois comia alguns insetinhos que passavam pelo solo, principalmente baratas.

Agora, já adulto, a terra não me afaga mais o paladar. Quero uísque, mas a garrafa está vazia. A boca, sedenta pelo gosto de carvalho envelhecido, não consegue se controlar. Deseja álcool. Deseja malte. No entanto, como o desejo da parideira estridente de um bode com cabeça de jaca, aquele da boca também não havia de se realizar.

Queria escrever um diário, mas isso é coisa de menininha, disse minha mãe. Vira homem, meu filho! Seja macho, não machucado! Seu pai está morto, mas menino não chora. Você agora é o homem da casa. 

Hoje, ela está lá, entrevada numa cadeira de rodas. E eu estou aqui, entrevado numa privada, enchendo um jarro com meu próprio mijo. Se não tenho uísque, bebo urina. É tão quente e ardida quanto. Ainda mais quando se leva em consideração que a minha garrafa não é da Irlanda, não é da Escócia, nem de qualquer outra terra da rainha sem salvação, embora muitas tivessem sido as súplicas dos Sex Pistols a Deus. Minha garrafa é americana, mas não da América dos escombros de Manhattan, e sim daquela cuja ponte é a alegria dos camelôs tupiniquins.

Na verdade, nada disso. Só agora me dei conta de que essa América é apenas cabine de pedágio do contrabando internacional. O meu uísque deve ter origem na terra dos camponeses de olhos puxados. E, vindo de lá, nem sei mais se minha garrafa era de uísque ou de licor barato. Licor de barata. Só sei que, sendo assim, licor de malte possui o mesmo gosto que licor de barata que possui o mesmo gosto de urina. 

E barata tem realmente gosto de mijo, afinal? Quando comi, era muito pirralho para saber. Não me lembro do sabor. Mas se tem, decerto as baratas são canibais. Pois se vivem no esgoto, se nutrem de mijo, de fezes, de tudo o que é podre e também hão de se comer.

Eu bebo urina. Eu bebo licor de barata. Logo, sou canibal. Logo, sou cria de uma barata. E, se comia baratas na terra do jardim de infância, é porque, logicamente, também sou uma.

Bremmer Augusto Guimarães

sábado, 29 de dezembro de 2012

Cartas a Lianna - carta IX

Querida Lianna, soube que ficou adoecida esses dias, e me sinto mal por não poder estar aí com você. É tão ruim saber que se está longe de alguém que ama, e logo quando esse alguém está mal. Queria poder apertar sua mão e te falar que tudo vai ficar bem, que você vai melhorar logo. Mas infelizmente eu tive que vir à Veneza. O senhor meu tio faleceu, e a senhora minha tia estava desolada. Não pude dizer não a ela. É minha família, você mesma consentiu com isso, embora com pesar. Não sabia que adoeceria, e peço desculpas por isso. Foi horrível vê-la daquele jeito, e ainda mais num tempo como il carnevale. Sim, querida, é época de carnaval aqui em Veneza e eu me recordei do nosso primeiro carnaval aqui, há dois anos. Ah, as belas máscaras da nobreza, e os belos panos e danças... Lembro-me de quando saíamos nas noites enluaradas e passeávamos nas gôndolas, atravessando os canais e observando as luzes da festa. Eu com minha máscara de gatto e você com a da colombina... Sinto falta daqueles dez dias em que passamos juntos, meu amor. Mas hoje, de longe é um carnaval feliz: você está adoecida, meu tio morto e estamos distantes um do outro. O que resta é apenas suspirar pela perda, e torcer para pode te ver de novo, forte e bela, assim como estava quando eu tive que partir para cá. Oh, minha querida, espero que me perdoe por não poder estar aí com você, mas quando eu voltar te contarei de todas essas belezas de novo, dessa festa belíssima de Veneza, que é o carnaval. Em alguns dias estarei voltando para você, minha bela Lianna.

Com amor, Giuliano.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Algo copiado e colado

"Eu olhei. Ele não
Eu insisti. Ele nem aí
Eu desviei. Ele olhou
Eu não. Ele insistiu
Eu nem aí. Ele desviou
Eu solidão. Ele solidão

Talvez seja a única semelhança entre nós... Solidão. Talvez seja o único ponto de encontro entre nossas almas, o único."

(Déborah Diniz)

domingo, 23 de dezembro de 2012

Boa noite.


Mas não liga, nem manda mensagem...
Não nesses dias em que vai 
passar a noite fora.
Prefiro imaginar que está dormindo
meu amor, linda e profundamente
que lembrar que só
foi dormir na hora
de acordar.

sábado, 22 de dezembro de 2012

A saudade sempre existirá

A gente sempre tá com saudade. Quando não é de casa, da família, é da turma da faculdade, da namorada, dos amigos que estão longe... Deixei João Pessoa ontem pra voltar pro Brejo e matar a saudade do pessoal todo daqui, mas com isso já trouxe as saudades dos amigos que fiz lá. Sim, já senti que alguns serão meus amigos sempre. Aqueles que eu brinco, xingo, mas que sabem que faço isso simplesmente porque gosto deles. E que também fazem o mesmo comigo, porque aos amigos se dão algumas liberdades. Não há como deixar de sentir saudade, nem por um minuto. Só se por algum momento se pudesse juntar todas as pessoas que você gosta no mesmo lugar, mas não dá. Saudade é isso, é querer logo ver quem está longe, e passar um tempo longe de quem acabou de ver, pra depois rever e acabar com ela (a saudade). Bom, acho que vai ser só isso mesmo, não dá pra descrever quando sente saudade de alguém, dos amigos, da família. Isso só se sente...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O fim


Venha, meu amor
Ponha sua máscara e dance comigo
E não importa se não tivermos abrigo
Te abrigarei em meu peito
e do parapeito da janela
Assistiremos ao fim
Pra você e pra mim...

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Cartas a Lianna - carta XII



O barulho do apito do trem me fazia lembrar os tempos em que nós corríamos juntos nos campos florentinos, e eu te pegava uma flor e a colocava em seus cabelos, pretos como a noite. E fazia isso simplesmente porque, mesmo quando bambino, já sabia apreciar a sua graça, e qual cor de rosa caía-lhe bem na pele branca. Brincávamos, oh, duas crianças inocentes. Você era a minha donna, e eu era o seu signore. Pegava-te pelos dedos, como se pega uma delicada rosa, mesmo com seus espinhos. Mesmo não sabendo do que o futuro guardava, prometemo-nos um ao outro. Promessa sem sentido, de criança. Vai saber o que se tem em mente um garoto de 8 anos, como eu era... Olhando pela janela vejo os mesmos campos em que corríamos todo o dia morrerem nas mãos desses novos homens. E os vinhedos, ah, aquele doce cheiro das vinhas. Tudo isso vai ficar para trás, agora que estou partindo neste trem. Não haverá mais brincadeiras, nem mais esconderijos, aliás, só o meu, e também o teu: para sempre escondida naquela cova fria e escura. Estou partindo, pois aqui, no meio dessas lembranças, meu peito dói por não poder repeti-las. E também porque preciso. O senhor meu pai há muito pede que o visite na velha Roma. Embora não goste de lá. Minha irmã se casará em breve, e aproveitarei essa chance para revê-los. Sim, todos eles, menos a senhora minha mãe, que não me deixou só um minuto e agora está ao meu lado, cansada. É a idade. Lembro também do tempo em que namoramos, ah, e que belos tempos eram aqueles. Mas deles agora só restaram as cartas que te escrevi, e minha dor de ter que lembrar. Não de todos, alguns não doem, mas outros irão me torturar para sempre, minha bela moça. Então é isso, o trem já corre em ritmo, e assim também devo eu. Assim como a primeira carta que te escrevi, quando ainda éramos pequenos, está não será a última. Madonna mia, para sempre serei seu prometido, assim como sempre fostes, até o dia de sua morte, minha Lianna.


Com amor, Giuliano.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Uma menina


Era uma menina
mas não como qualquer menina
não como uma qualquer
que só tem short curto
e blusinha 
era uma menina que gostava de blusa
casaco e sainha.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Legião...





"Podem até maltratar meu coração
Que meu espírito ninguém vai conseguir quebrar!"

Legião Urbana - Um dia perfeito

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Reflexão de um soldado



tárarararararararararararatá tárararararararaarararararararararararararaara tá tá
tárarararararararararararatá tárararararararaarararararararararararararaara tá tá

'Granada!'

Pergunto-me porque lutamos essa guerra. 
Essa guerra não é minha, não é sua, essa é a guerra deles.
Luta porque é honrado em defender o teu país, tua nação.
Honra de minha nação? 
Uma nação que me estupra, que me emburrece, que me adoece, que me deixa inseguro, que me aliena e que me rouba a liberdade de estar em casa descansando meus dedos?

é por essa nação que se luta? 
Essa guerra não é minha. 
Honra mesmo seria ter qualidade no que é necessário.
E quantidade no que é desnecessário.
Que fossem poucas escolas, mas que fossem boas de verdade.

tárarararararararararararatá tárararararararaarararararararararararararaara tá tá

'Granada!' 
Por essa nação eu teria honra de morrer e de lutar por.

'ARGH!'
morreutãorápidocomotirodecanhão.

domingo, 28 de outubro de 2012

Arthur, o problemático.


Arthur tinha um problema. Desde que era novo nunca se importara com outra pessoa. E quando entrou na puberdade, que é o tempo em que os garotos começam realmente a se interessar por garotas, ele foi diferente. Não tinha interesse em sair com garotas, ou beijá-las, e muito menos transar com elas. O que dava prazer à sua vida era observá-las indo e vindo. Observava-as de longe, de perto, batia fotos. Mas ele tinha um problema, e isso fazia parte deles. Em seus pensamentos, sujos e sombrios, qualquer garota, independente da idade, se já tivesse as curvas que o interessassem já tinham feito sexo com ele. Sim. Esse era o problema de Arthur. Sua mente era doentia. Mesmo que ele não tentasse nada contra as garotas, sua cabeça estava cheia delas. Sangrando, suando, gritando... E ele sentia um prazer enorme, como se realmente acontecesse. Toda vez que batia a foto de alguma foto, era certeza de mais um dia 'sujo' em sua mente. Quando envelheceu mais um pouco entendeu enfim o que lhe acontecia. Ele não sentia empatia por ninguém. Era egoísta, só tinha vontades e olhos pra si mesmo. Não se importava em usar uma pessoa como um peão de tabuleiro, se aquilo o trouxesse prazer (e trazia). Mesmo mais velho, ainda tirava fotos das garotas, fazia alguns vídeos e depois ia vê-los. Não tinha amigos, mas na cabeça dele, para quê serviriam? Se não havia sentimentos, não havia nada para compartilhar. Vivia sozinho, como lhe era de agrado. E gostava. Sim, ele curtia aquilo. A solidão física. Mas a sua mente estava sempre cheia. Cheia de momentos, de imagens que ele tinha prazer em projetar. Arthur não se importava com ninguém, e nunca irá se importar.

sábado, 13 de outubro de 2012

Sorrisos em Londres


Caminhando pelas ruas de Londres, Anna tirava fotos das casas, das pessoas em suas corridas diárias, das flores nos parques... Tirou uma do 'Big Ben', ah, o 'Big Ben', marca registrada da capital inglesa. Encontrou um casal que namorava num banco, que estava próximo a uma das famosas cabines telefônicas londrinas. Não perdeu tempo e logo se aproximou do casal, perguntando se poderia tirar uma foto deles, pois em meio aos acontecimentos e a correria mundana encontrar um casal assim, tão alheio a tudo, era difícil. Sorridentes, os dois disseram que sim, ela poderia tirar a foto. Brandon e Carly. Ao fundo pessoas e flores, carros e os ônibus de dois andares. Ela agradeceu pela foto e saiu de novo pelas ruas até chegar à 'Tower Bridge'. Ah, como era mais linda de perto... Seus olhos até se encheram de lágrimas. Não, não era a primeira vez que ela ia ali. Mas todas as vezes que ela a via de perto isso acontecia. Era o seu ponto favorito na cidade. De lá que tirava as melhores imagens pros seus álbuns. Bateu algumas fotos dos carros que iam e vinham e os pedestres que admiravam o lugar, sempre com belos sorrisos estampados. E o dela também se estampava por trás da lente. Sim, sempre com seu sorriso escondido, apenas captando os sorrisos desconhecidos pelas ruas. Dos mais ricos aos mais pobres. Os sorrisos são todos iguais. A mais bela feição de cada ser humano... 

sábado, 8 de setembro de 2012

O primeiro dia


Ele estava se arrumando quando recebeu sua mensagem 'quando estiver saindo me avisa'. Imediatamente digitou de volta que estava arrumado e já ia saindo. Na sua cabeça passavam várias maneiras de fazer o pedido que há alguns dias já pensava em fazer. Não sabia se pedia no começo, no final, no meio. Se fazia algum tipo de declaração ou discurso, se dava algum presente, se chamava pra jantar, ou se simplesmente pedia pra ela encostar a cabeça em seu peito e falasse no ouvido dela. Ali mesmo, baixinho, pro mundo inteiro ouvir. Um mundo só deles dois. Onde as regras são as mais simples: amar, cuidar e alegrar. Tudo terminado mesmo com 'ar', pra dar a sensação de que um respiraria o ar do outro, se precisasse. Botou o perfume que ela tanto gostava de cheirar e saiu. Quando chegou lá esperou alguns minutos até que ela chegasse: estava linda como sempre. Seu belo sorriso se abriu pra ele, que já sorria desde o momento que viu sua mensagem dizendo que estava chegando. Subiram juntos e ele sentiu aquele cheiro que tanto gostava, que tanto o fazia querer viver pregado ao pescoço dela, pra que não perdesse nenhum pouco daquela essência. Lá em cima eles mataram as saudades de alguns dias, de alguns meses, vai saber como corre o tempo de quem está apaixonado, não é? Era um momento tão único como todos os outros que eles passavam juntos. Trocavam beijos, abraços, carícias, olhares, toques... O que tinham trocavam entre eles. E então em um desses momentos ele se decidiu e disse pra ela colocar a cabeça no peito dele, e falou baixinho no ouvido dela: 'aceita ser minha namorada?' Ela o encheu de mimos e beijinhos e disse 'mas é claro que aceito'. E continuaram a trocar os seus 'tudo que tinham no momento' enquanto a noite estrelada brilhava para eles, como se filmasse tudo o que estava acontecendo, e os dois ficaram ali, olhando aquela noite maravilhosa, e sorrindo sentaram, e viveram um pro outro aquele momento.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O garoto que imaginava


Havia um garoto, numa cidade distante, que gostava de imaginar. Ele criava histórias com qualquer objeto ou ser que visse. Na sua mente ele dava vida e ação, ao que era inanimado. Bom, pelo menos não aos olhos dele... Tudo que ele via, logo criava uma narratória espetacularmente original e cheia de aventuras. Costumava ficar no seu quarto, olhando a rua e as pessoas que ali passavam, criando personagens: heróis e seus respectivos arqui inimigos, que podiam ser objetos, animais, até mesmo uma força da natureza, como o vento. Ah, aquele garoto era demais... Ele podia fazer com que você viajasse dentro daqueles pequenos contos, mesmo não sendo uma sequencia. Não gostava de ficar muito tempo na mesma narrativa. Queria sempre algo novo: novos personagens, novas histórias, novos cenários... Era como uma fênix que sempre renascia bela e radiante. E como eram belas as histórias desse garoto... Em um texto você está num lugar chuvoso e sem graça, e no outro lhe aparecem diamantes e sorrisos cheios de graça. Uma vez eu perguntei a ele como ele conseguia descrever tão bem esses lugares, essas histórias, e ele me respondeu que a vida real era muito chata. Sem a emoção de uma corrida contra o tempo numa ruína prestes a desabar, só para encontrar um pedaço de papel que supostamente levaria ao tesouro perdido de Avalon. Ele preferia criar histórias que não fossem de acordo com a realidade, simplesmente por achá-la chata e lenta. Sim, esse garoto podia fazer tudo isso sem sair do seu quarto. Quantas aventuras será que ele já viveu, não é? Não se sabe ao certo, mas sabe-se que foram várias. E todas guardadas em um único diário, que se abrirá para vocês, talvez, em breve...

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Manhã de Outono


Ela estava deitada na cama do quarto, pensando nos planos de hoje e com quem seria. Era bela e branca. Cabelos escuros que mudavam de tom todos os dias, como se mudasse com seu humor. Não era uma daquelas garotas bombadas da tv de hoje em dia, e agradecia por isso. Até porque nove em dez homens preferem garotas com seios grandes, e ela os tinha. Na medida certa. Quando finalmente decidiu pra onde ir, abriu a janela e olhou longe: o vento levava várias folhas secas e as que caíam das árvores de encontro ao chão, como tudo que cai tende a ir. Era Outono. Ela pulou pela janela e sentiu quando o vendo levantava sua saia que ia na coxa, mostrando sua calcinha vermelha. Mas ela não se importava, continuava andando. O decote de sua blusa folgada mostra o seio, que chamava a atenção dos caras que passavam por ela. Ah, como era bela aquela moça... Avistou um rapaz. Sim, era quem ela procurava. E ele estava ali por ela. Pegou-a pela cintura e a beijou profundamente. Eles sorriam um pro outro. Não um sorriso simples, que se dá ao vizinho ou a um  amigo. Era um sorriso bobo, sincero. Um sorriso que não parecia muito ser dado. Que ela só dava quando estava com ele e ele com ela. Os olhos dela, castanhos e pequenos, brilhavam quando aquele rapaz a olhava tão de perto. Ele a pegou pela mão e a levou consigo, para onde não haveria tumulto. Onde eles ficariam sozinhos o quanto quisessem, e poderiam fazer o que realmente estavam querendo. Bem longe dali, onde as histórias não podem contar, nem os homens podem avistar. Só... Longe dali.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Um reencontro


Tom gostava muito do tempo frio. Gostava de passear entre os campos e sentir o chuvisco caindo em seu rosto. Ela iria chegar hoje. Havia dez meses que não a via e estava com muitas saudades. A última carta que recebera dela foi lida e relida inúmeras vezes. E em todas elas ele abrira um sorriso. Há tempos não se sentia tão feliz com a chegada de alguém, e muito menos de alguém que não há muito tempo entrou na sua vida. Ele lembrava do sorriso dela, que vinha sempre que ele a olhava nos olhos, e automaticamente fazia o dele aparecer também. Quando viu aquela saia no joelho descendo do ônibus e os cabelos pretos que batiam no antebraço, sentiu que sua respiração acelerava cada vez mais. Então ela desceu e o viu. Ali em pé, olhando pra ela. Com aquele sorriso bobo de quem está apaixonado. Correspondeu com seu sorriso e desceu correndo para abraçá-lo e beijá-lo e matar as saudades que tanto doíam nos dois. Ele a pegou pela cintura e a abraçou forte, como se agarra a seus melhores sonhos. Não trocaram palavras, somente olhares. Palavras pra quê? E também como? Suas bocas queriam apenas beijos. E assim foi. Trocaram seus olhares, seus beijos e seus toques de pele, que há muito não sentiam. Foram passear entre os campos, onde ele colocou uma rosa branca em seus cabelos pretos, e beijou-a na testa. Como se faz com quem você quer cuidar enquanto puder...

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Pra ele e ela.

Ele se sentia muito bem com ela. Não era uma pegação qualquer, onde no outro dia ele ou ela estaria com outra pessoa. Não! Era mais sério que isso. E mesmo sempre tendo dito que não queria ter nada sério com ninguém, parece que ela o fez mudar de opinião. E toda vez que marcavam de sair, ele se animava como se anima uma criança ao ouvir a voz da mãe. Como um cachorro se anima ao saber que o dono está chegando, e como a rosa se anima ao ser cultivada. Era um sorriso que vinha naturalmente, sem forçar, o que se fazia na boca dele, sempre que iam se encontrar. Não só seu sorriso se abria, como seus olhos ansiavam pela imagem dela. Realmente ele estava gostando de alguém. Alguém que gostava dele também, que correspondia aquele gostar. Que tinha seus olhos nos dele ao dizer que felicidade mesmo é estar perto de você... É pouco, mas ele sabe que o que puder fazer pra vê-la feliz, ele fará.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

No dia seguinte



Ah, aquela noite foi de mais! Ela realmente soube o que fazer. Mesmo com carinha de menina ela mostrou onde estava a mulher. Minhas mãos deslizavam por seu corpo branco e suado. Suas mãos em meu peito e aqueles movimentos... Quem não ficaria louco com isso? E quando trocamos de lugar então? Aah, ela enroscou suas pernas nas minhas e me puxou com força. Ah, eu beijando aquela barriguinha, e subindo pelos seus seios... Que belos seios! Aquele vai e vem por cima dela, que puxava meu cabelo de encontro a seu corpo que se contorcia sobre o meu. Depois do sexo ela acendeu um cigarro e ficou sentada, olhando pela janela a lua lá fora, soprando fumaça. Sem vestir a roupa, foi até a cozinha e pegou um litro de Vodka na geladeira, e voltou sem nenhum copo. Como se alguém ligasse. Bebeu na 'boca' mesmo. Depois peguei dela e bebi também. Passou um tempo lá, deitada, até que decidiu ir pro banheiro. Ligou o chuveiro e molhou seu corpo claro como a lua, ou como porcelana, se preferir. Deixou a água descer por todo ele, fazendo as curvas que ela tinha perfeitamente escritas. Levantei também, aceitando aquilo como um convite. Fui até o banheiro e entrei, quando me deparei com aquela linda mulher, com seus belos seios redondos e seus olhos castanhos. Aquele sorriso na boca, e que bela boca! Peguei na sua cintura e cheguei mais perto, sentindo mais uma vez sua pele de veludo junto da minha. Sentindo meu pênis entre as pernas dela, beijei seu pescoço e lhe apertei os seios, o que a provocou um arrepio e um suspiro de desejo. Ela se virou pra mim e me beijou. Encostei ela na parede e a pressionei contra a parede. Peito no peito. Senti seu coração batendo ali, bem perto do meu. Beijei seu pescoço, e fui descendo, descendo... Foi uma noite daquelas, e quando acordei ela tinha ido embora. Foi embora e me deixou com aquele gosto na boca, no corpo, nas mãos...

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Tempo frio



Os dias agora vêm mais frios. Não! Não estou dizendo que estão ruins e sem fogo, mas só que o tempo está frio. E está como eu gosto: céu nublado, chuviscos, vento gelado batendo no meu peito e no meu rosto. Os campos aparecendo mais verdes pela minha janela. Ah, como eu gosto desse tempo... É como se sua boca me soprasse um pouco de felicidade a cada segundo. Como se meu rosto sentisse teu suspiro toda vez que olhasse pras nuvens no céu. É o tempo em que a grama vai crescendo mais bonita, que as flores vão sorrindo para você... Ah, como não se encantar com os campos? As flores? Os teus lábios a sorrir? Tuas mãos indo de encontro a teus cabelos escuros. Teu corpo procurando o meu, na porta da cozinha, pra buscar o calor que saiu cedo da cama. Que foi sentir aquele vento frio que começou a soprar só agora. E que tem o rosto e o peito acariciados tanto pelo vento, quanto pelo toque quente de duas mãos... Tuas mãos de veludo, de cetim, de algodão. Tua pele de ser humano, que é quente por dentro, por fora. Ah, quero mesmo é teu sopro quente no meu rosto.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

No fim da noite.

De novo você, cara? Não se cansa não de tentar me pegar? Acho que não te disse que só fico se tiver mais de 17 cm. Ah, garotinho, você é só um pedacinho de homem. Não saberia como tratar uma mulher, assim como eu. Aposto que nunca teve uma noite de sexo, né criança? Fica só nas bronhas, na frente daqueles sites pornôs. Revista é ultrapassado pra você, 'garoto moderno'. Está frio. Você com essa camisa regata, parecendo um desses garotinhos de programa, que não sente nada. Nem frio, nem calor. Nem um pouco de romance. Você não sente nem mesmo remorso por cobrar tão caro das necessitadas. Ah sim, você conhece pelo olhar aquelas que pagariam caro pelo seu corpo. Mas eu não, garotinho. Eu sou mais macho que você! Eu sinto prazer. Eu sinto o romance, o amor. Sinto o fogo que vem por debaixo da saia. Na verdade, você só sente orgulho. Isso mesmo! Fica se achando porque come essas menininhas por aí. Como se não fosse fácil comer essas putinhas na flor da idade, doidas pra dar a bunda a um garoto assim como você: cabelinho loiro, olhinhos castanhos, corpinho malhado. Por favor, cara, no dia que 'cê' pegar mulher de verdade me procura. E de novo você acha que pode vir aqui, no mesmo bar, na mesma hora, tentar me levar pra sua listinha de 'já comi'? Não. Muito obrigado. Mas quem eu quero já me achou. Só está esperando a hora certa pra aparecer. E você vai logo saindo dessa cadeira, que esse lugar é dele, ou dela, depende. Se aparecer e me fizer sentir na primeira noite. 'Bye bye', menino, vai lá brincar de comer mocinha. Não sou puta nem putinha de carro. Não transo com motor. E mais uma: noites de prazer não dependem só do tamanho de um pênis, mas também de boa música, um bom jantar, chupadinhas, e palavras sujas no ouvido, sabe? Preeliminares são muito importantes.





Ass.: Tisha

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Desabafando

Ah, cara. Não venha aqui pra me dizer que sua vida está ruim. Eu não ligo. Não fui eu quem a deixei ruim, não sou eu quem vai deixá-lo melhor. Não se você chegar e só dizer. Esperar empatia de mim, cara, não é algo que se deva fazer. Não sinto isso. Eu não posso saber se você está precisando de mim quando você não me diz o que precisa. Também não dê suas opiniões quando eu não pedir. Quando eu chegar e dizer que 'não está fácil pra ninguém', não me pergunte por que. Se eu fosse dizer o que está difícil, você reviraria os olhos e soltaria um suspiro de 'que mina chata'. Não queira dar uma de bom samaritano quando você não se importa. Simplesmente fique na sua e me escute! Eu 'to' na minha. Não entro na sua até que me chame. Eu 'to' na minha e se você, cara, quiser estar na minha também, saiba respeitar. Saiba se respeitar. Saiba me respeitar. Respeite sua mente, seu espírito, seu corpo... Mas respeite os meus também. Não é porque te olhei que vou querer você em cima de mim. Embora você seja bonitinho. Com seus músculos e seu cabelo curtinho. E esses olhos castanhos agressivos. Não, cara, não é assim. Você não sabe entender os olhares de uma garota. Então não ache que porque me viu num bar eu 'to' triste e sozinha, ou triste por estar sozinha. Não estou. Não chegue em mim se eu não der 'bola' pra você. Vai lá procurar outras vadias. Só me deixa terminar meu whisky sozinha. Deixa eu terminar meu cigarro sozinha. E dê uma gorjeta pro garçom que vai te entregar esse recado. Quem sabe outro dia, né?




Ass.: Tisha.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Diário de Tisha

07 de Abril - A noite de ontem foi boa, mas aconteceu algo estranho, que eu não esperava. A Ana chegou às sete e quinze e a gente subiu pro quarto. Minha mãe tinha viajado, só chegou hoje. A gente viu o filme e chorou tomando vodka, que ajudou um bocado. Depois ficamos conversando sobre roupas, garotos e outros assuntos... Ela me olhava de um jeito diferente. Parecia querer tirar toda minha roupa. Estava bem estranha, mas avaliei que seria a bebida. Ela sempre faz isso com as pessoas. A gente ria de tudo, até da risada da outra. Ela decidiu tomar banho e eu fui com ela, afinal estava fedendo a vodka. Mas foi no meio do banho que tudo aconteceu. Ela passava a mão no meu corpo, causando-me arrepios. E ia chegando mais perto e mais perto. Subiu a mão pela minha barriga até chegar no meu seio. O toque dela era macio, até me excitou. Eu não sei o que houve mas eu não me movia e não sentia nenhum medo. A outra mão dela subia pelas minhas costas, até chegar no meu pescoço. E vindo na minha direção, senti seus lábios pequenos tocarem os meus carnudos, uma sensação boa, porque de olhos fechados você não vê se a boca que te beija é de macho ou fêmea. Bocas são todas iguais, os lábios que são diferentes. Foi engraçado não sentir o peito musculoso de Led e sim os seios grandes e redondos da Ana contra os meus pequenos, que palpitavam ligeiramente. Eu envolvi minhas mãos pequenas na cintura dela, e senti a maciez de sua pele, e que pele. Não sei se por efeito da vodka ou pelo calor do momento, apertei ela contra a parede e senti suas mãos descendo pela minha cintura, até apertar minha bunda, numa massagem gostosa. Caminhamos juntas até a cama, molhando o chão, e nos jogamos. Ela me olhava com um olhar feroz e sensual, e veio de encontro a meus seios, e aí desceu pela minha barriga até chegar no lugar certo. Até parecia que ela sempre quis fazer aquilo, e eu, no momento, não reclamava, mas lembrava de quando era Led que fazia aquilo comigo. Ah, aquela foi uma noite muito boa. Não sei se foi só a vodka, ela parecia estar ciente do que fazia. Acho que ela gosta de mim.

Um ponto final



Toda vez que escuto Summertime da Janis, vem-me à cabeça uma cena de uma rua escura. Uma rua calçada com pedras redondas, como as ruas antigas. Com casarões e casinhas, e uma garota que anda sozinha. Ela sente falta do homem que mais amou na vida. E aquela brisa da noite, com o sino badalando às três da manhã, fazia-a algum bem, que ela não sabia explicar. Só a luz da lua iluminava aquela madrugada, naquela rua solitária, naquela garota solitária. Mas uma lâmpada acesa que iluminava uma placa que dizia 'Bem-vindo' estava acesa toda madrugada. Era a entrada de um bar. Um bar onde essa menina sempre ia, pra lembrar de seu pai. Ele sempre ia naquele bar. Sentava sempre na mesma cadeira. Pedia sempre o mesmo whisky. Aquele Jack Danniel's 18 anos. E desde que fora morto em confronto com a polícia, deixou sua filha sozinha no mundo. Mas ela aprendeu a se virar. E até que virava bem, pra conseguir dinheiro, comida e abrigo. Tudo que seu pai tinha era alegria e ela não precisava de mais nada. Agora ela precisava, já que a alegria tinha ido embora quando ele morreu. Fazia programas pra se sustentar, e garantir a tradição do pai. Era uma moça forte, embora estivesse fraca e cansada de tudo aquilo. Pelo menos ela gostava. E toda vez essa história se repete, toda vez que eu ouço a mesma música. Mas o fim, ah, o fim dessa história não existe. Meus pensamentos são muito voláteis, não consigo continuar uma mesma história sem entrar em outras e outras. E isso não teria fim, se eu não colocasse um ponto final.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Morto queimado ou homem que morreu carbonizado?

           Sinceramente, não entendo mais a sociedade contemporânea. A falta de respeito se dá com tudo e todos. Hoje fiquei chocado quando liguei a TV, e vi a manchete: "Morto queimado: crueldade em Assaré", quer dizer: nem os mortos estão respeitando mais, eles que não têm nem como pedir socorro. A população também não entendeu porque alguém queimaria aquele pobre morto, mas não tirava os olhos do corpo queimando. Não sei bem o que a polícia vai fazer com esse sujeito, afinal, as leis no Brasil só servem - e pouco - se você estiver vivo. E se você for mendigo ou criança de rua, tem quase todos os direitos que uma pessoa morta. É de chorar de emoção, não é mesmo?
           Deixo aqui minha sincera indignação com esta pessoa que queimou o pobre morto, e também com a justiça brasileira, que, pelo que sei, deve ao menos prender esse covarde por violação de túmulo, que é o único patrimônio que se tem após a morte. E deixo também... Pra falar a verdade, é melhor não deixar mais nada, e levar tudo à escola, ou então chegarei atrasado.

*texto de 27/04/2011 que foi postado originalmente na minha conta do recanto das letras, visita lá http://www.recantodasletras.com.br/autores/kilbnb

domingo, 27 de maio de 2012

Um desejo realizado



Ele estava nervoso ao sair de casa. Encontrar-la-ia aquela noite. Ela, que ele tanto gostava (e gosta), iria dizer naquela noite, que também gosta dele, mas ele ainda não sabia. Assim que chegou ao lugar esperado, ligou para ela, avisando que tinha chegado. Subiu as escadas, o coração palpitando de tão nervoso que estava. Sentou numa cadeira e ficou imaginando o que dizer. Como dizer. Embora tivesse passado semanas imaginando a resposta dela de várias formas, ainda não sabia qual seria a resposta. Olhou pela janela, mas não a viu chegando. Até que recebeu uma mensagem. Uma mensagem dela, dizendo que já tinha chegado. O coração bateu mais rápido, bem acelerado. Até por que era tudo novo para ele. Ela apareceu ali, na sua frente, e ele foi de encontro a ela. Abriu com um barulho a porta que dava para a parte do terceiro piso em que acima deles só ficassem as estrelas a brilhar e a lua a sorrir... Conversaram durante horas. Ele a contava o quanto imaginou aquele momento nas duas semanas passadas. Desde que admitiu gostar dela. O quanto ansiava para que o dia chegasse logo. Trocaram olhares, sorrisos, afagos... E depois de muito conversar, ela então, com um sorrisinho tímido e com as mãos no rosto, deu sua resposta 'sim'. Ele perguntou de novo, não sei se para ter certeza, ou se porque não ouviu, mas perguntou. E quando ela repetiu, foi como se um peso fosse tirado de cima dele. Como se realmente os sonhos que ele teve acordado pudessem se realizar. Embora ele soubesse que para realizar ele tinha fazer porque realizar. E ele fez. Eles se abraçaram por um longo tempo. E aquele beijo que ele tanto imaginou, que ele tanto ansiou, veio. Veio com uma risada e um pedido de desculpas por parte dele. Mas depois voltou. E dali em diante, os dois passaram mais horas juntos. Falando um ao ouvido do outro, colados. E trocaram carícias, olhando o céu estrelado, como se aquele momento não fosse acabar. E não ia, a menos que eles quisessem. E eles não queriam. Não queriam que acabasse.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Uma rosa inglesa



Na cidade de Liverpool, Isa caminhava por entre os campos floridos, sorrindo e cantarolando uma canção dos Beatles. Seu cabelo era curto, não tinha seios grandes, mas seus grandes olhos castanhos compensavam. Vez ou outra acendia um cigarro, ia em raves, dormia na casa de amigos, ficava com alguns e os deixava pra trás. Tinha o desejo de ser livre. Era vaidosa, como qualquer garota, mas não pra passar horas na frente do espelho. Seu rosto era bem bonito: nariz pequeno, olhos grandes (que já citei) e uma boca do tamanho certo de um beijo - mas qual seria o tamanho de um beijo? - Suas roupas, quase todas, tinham sempre o toque dela. Cortava uns vestidos longos, que ficavam melhor mostrando suas pernas, rasgava algumas calças... Seu corpo era magrinho, mas muito bom de apertar - e contra a parede então... Não chamava a atenção só de garotos, até porque não dava atenção só a garotos. Seu espírito era de aventura. Suas mente era uma aventura. Ela era como uma rosa: cheirosa e delicada, mas se tentasse pisar nela, furava-os com seus espinhos. Quando se trancava no quarto tirava toda a roupa e se olhava de cima a baixo no espelho. Imaginava-se de outras formas, talvez com mais curvas aqui e ali, cabelos longos, pele mais clara. Embora fosse bonito, não tinha muito gosto pelo corpo. Mas de tanto se olhar e de se imaginar de outro jeito, percebeu que o que a fazia sexy era o fato de ser daquele jeito. Sabendo bem o que encaixar no seu corpo magrinho, como ela sabia. Depois deitou na cama e apertou o travesseiro contra os seios e fechou os olhos.

Crônica do Amor


Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo a porta.
O amor não é chegado a fazer contas, não obedece à razão. O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar.
Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referenciais.
Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca.
Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera.
Você ama aquela petulante. Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu flores que ela deixou a seco.
Você gosta de rock e ela de chorinho, você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no
ódio vocês combinam. Então?
Então, que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.
Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário. Ele não emplaca uma semana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele não tem a
menor vocação para príncipe encantado e ainda assim você não consegue despachá-lo.
Quando a mão dele toca na sua nuca, você derrete feito manteiga. Ele toca gaita na boca, adora animais e escreve poemas. Por que você ama
este cara?
Não pergunte pra mim; você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais. Gosta dos filmes dos irmãos Coen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem seu valor.
É bonita. Seu cabelo nasceu para ser sacudido num comercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar. Independente, emprego fixo, bom saldo no banco. Gosta de viajar, de música, tem loucura
por computador e seu fettucine ao pesto é imbatível.
Você tem bom humor, não pega no pé de ninguém e adora sexo. Com um currículo desse, criatura, por que está sem um amor?
Ah, o amor, essa raposa. Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática: eu linda + você inteligente = dois apaixonados.
Não funciona assim.
Amar não requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC. Ama-se justamente pelo que o Amor tem de indefinível.
Honestos existem aos milhares, generosos têm às pencas, bons motoristas e bons pais de família, tá assim, ó!
Mas ninguém consegue ser do jeito que o amor da sua vida é! Pense nisso. Pedir é a maneira mais eficaz de merecer. É a contingência maior de quem precisa.

(Arnaldo Jabor)

quinta-feira, 10 de maio de 2012

A última dama


   Ele chegou às quatro da tarde naquele grande hotel que mais parecia um castelo. Olhou pros lados mas não viu ninguém para recebê-lo. Abriu a porta e foi procurar alguém na recepção: de novo, ninguém. Encontrou apenas uma chave em cima da bancada. Pegou a chave e entrou no elevador. Chegando no corredor do seu quarto, sentiu uma presença forte no fim dele. Era como se alguém olhasse pra ele pela brecha da porta. Caminhou até lá, mas quando chegou viu a porta fechada. Estranho, já que ele jurou que estava aberta. Entrou no seu quarto e foi dormir um pouco. Ouviu passos e música bem baixos, que certamente vinham do salão. Desceu até lá e abriu as portas, mas não viu ninguém.
    Já eram sete da noite e ele estava deitado, quando ouviu um sussurro "acorda, dorminhoco", e pulou da cama, literalmente. Não viu ninguém no quarto. Saiu pelo corredor até a porta do quarto que vira entreaberta mais cedo. Estava como ele tinha visto antes. Com um empurrão a abriu e tomou um susto: ele viu a si mesmo, sentado na cama, olhando para ele. O outro 'ele' usava um terno, com gola bufante, luvas brancas de látex e calça e sapato social. Desmaiou ali mesmo e acordou numa cadeira, onde no salão uma banda tocava e pares de casais gêmeos dançavam ali. Era uma valsa. E todos dançavam suavemente ao tom doce da melodia. Mas ele ficou inquieto, pois nenhum corpo exalava sinal de vida ou calor. Estavam todos mortos, inclusive ele, que sem nenhuma emoção levantou da cadeira, puxou a última dama e se pôs a dançar com ela.

sábado, 28 de abril de 2012

Um raio de sol


Ele já estava acordado, mas não abriu os olhos. Tinha medo de abri-los e perceber que aquela noite fora apenas um sonho. Ah, o calor do corpo dela se derramando sobre ele. Aquele beijos fogosos, olhares sedutores e toques sensíveis e fortes ao mesmo tempo. Aquele entrelaçar de pernas e braços e línguas e dedos... Os movimentos sensuais da cintura dela sobre ele, como se dissesse: "estou no controle!" E ela estava mesmo. Ele nem se atrevia a contrariar. Simplesmente acompanhava os movimentos. E que movimentos! Suas mãos deslizavam pela cintura dela, molhada de suor pela intensidade do momento. Ah! Foi uma noite e tanto. E agora ele estava ali, deitado, torcendo para que não tivesse sido um sonho. E quando ele abriu os olhos e a viu ali, deitada com ele, com a cabeça em seu peito, como uma criança que se sente protegida, foi só ali que ele se sentiu o homem mais feliz do mundo...

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Coluna no Don't dance, please

Então pessoal, dessa vez não é um conto, mas não deixa de ser uma prosa, né? (desculpem a piada). Venho para convidar todos vocês que me leem aqui no meu blog, pra também me ler no Don't dance, please, blog de um amigo meu, Lucas Diniz. Lá eu vou 'falar' sobre religião, ideologias e alguns grupos ativistas, não deixando de fora também alguns conflitos seculares e chamadas sobre doenças sociais. Então é isso, espero que visitem lá e confiram não só os meus, mas todo o blog que tá legal. Beijos e abraços, até mais.

domingo, 22 de abril de 2012

Um sorriso


Eles estavam sentados no banco da praça, conversando sobre música, irmãos e outros assuntos irrelevantes. Seu braço envolvia os ombros dela, que se encaixavam perfeitamente no envolver dele. Aquela brisa leve levava os cabelos dela ao encontro do nariz do rapaz, que sentia o cheiro adocicado do seu xampu e ele queria que nunca passasse. Olhou pro seu rosto que estava mirando duas estrelas solitárias no céu, e um sorriso tímido se fez no seu rosto: um sorriso tão bonito, que nenhuma daquelas outras curvas do corpo dela chamava mais atenção que aquela curva formada no rosto da garota. Era um sorriso de quem pedia um beijo. Na bochecha. Na orelha. Na boca. Ficou admirando aquele sorriso. Brincou com os cabelos dela, e tocou seu queixo, fazendo-a olhar para ele. Seus lábios foram de encontro ao rosto dela, mas num movimento súbito da menina, seus lábios se tocaram. Foi naquele momento que ele percebeu que era correspondido, que era sim a resposta dela, mesmo sem ter feito nenhuma pergunta. E ficaram ali, abraçados, olhando o céu.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

This Sith

        
         Sith estava sentado na frente da TV. O volume baixo pra não acordar a mãe. Assistia a um filme que os gritos eram altos para aquela hora da noite. Seus olhos duros miravam cenas que, para alguns, seriam de horror, mas que fascinavam o pequeno garoto. Um homem mascarado que cortava a pele de uma garota e assistia os pingos descerem, deixando tudo vermelho. Ele achava incrível o modo como o sangue escorria, o prazer que o homem sentia em cortá-la, além do terror nos olhos das vítimas, sempre garotas. Até porque o corpo feminino é de um chamado tentador.
        Ele nem dormia mais, estava viciado naquele filme. As cenas se repetiam cada vez mais frequentes em sua mente. Sua mãe estava deitada quando ele abriu a porta e ofereceu café. Ela agradeceu e tomou todo, coitada, apagou depois de cinco minutos. Ele procurou uma faca na cozinha e foi até o quarto. Amarrou os braços dela na cama e puxou uma perna pra fora, esticada, pra ver o sangue pingar no chão quando cortasse. Foi passando a faca devagar na coxa e desceu até o joelho. Uma sensação de prazer invadia seu corpo. Seus olhos estavam tão relaxados, sua mente estava tão relaxada, que não sentia remorso algum. "Não é errado se te faz bem", pensou consigo mesmo. Viu, os agora abertos, olhos de medo da sua mãe e sentiu uma pontada de poder. Mesmo nos trinta e dois, ela mantinha o corpinho de vinte, sem rugas, o que encantava mais ainda o garoto de dez anos. Passou pro braço e se encantava a cada membro que cortava, a cada rio de vermelho que descia do corpo branco de sua mãe. Depois voltou pra frente da TV, pegou uma cerveja e viu o filme mais uma vez.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Uma carícia


Estava frio naquela manhã de terça. Ela estava sentada sozinha, olhando pro céu nublado e pensando no que a deixara tão triste. Uma leve brisa soprava, fazendo esvoaçar seu cabelo pra trás dos ombros, com pouca força. Não sabia ao certo o que era, mas era muito o que a deixava pra baixo. Talvez a discussão com o namorado, ou aqueles que dizem ser seus amigos. Ou simplesmente o fato de estar triste. Mesmo que não achasse ruim o frio e a solidão, não reclamaria se certa pessoa chegasse e a abraçasse. Seu caderno, todo rabiscado, era apertado com força, até que ela o abriu numa página, e começou a ler um texto. Mesmo que por pouco, um sorriso se abriu na sua boca, e os olhos se encheram de lágrima, que caíam e os pingos manchavam a página. Quase pula de medo quando sentiu um toque em seu braço. Um garoto lhe estendia uma Margarida, com um sorriso sincero e olhos grandes. Ela pegou a flor e sorriu de volta, agradecendo. O garoto sentou do seu lado, e olhou o que tinha na página do caderno. Sorriu também. Olhou pra ela, chegou mais perto e a abraçou. A brisa leve acariciava os dois naquele abraço quente e gostoso, o que ela mais precisava. Não disseram uma palavra, mas conversaram muito entre olhares e toques. Toques no rosto, braço, boca. Trocas de carícias que qualquer um gostaria de dar e receber. Ele arrumou o cabelo dela atrás da orelha, para que seu rosto ficasse todo à mostra, e ele pudesse contemplá-la. Depois desceu o dedo pela bochecha e tocou seu queixo. De leve foi encostando sua boca na dela, que apenas esperava. E ali ficaram, sabe-se lá por quanto tempo, naquele âmago de olhares e carícias, que dali não sairia. Não enquanto estivessem ali.

domingo, 8 de abril de 2012

Grande Legião...

Daniel na cova dos leões
(Legião Urbana)
Dois


Aquele gosto amargo do teu corpo
Ficou na minha boca por mais tempo.
De amargo, então salgado ficou doce,
Assim que o teu cheiro forte e lento
Fez casa nos meus braços e ainda leve,
Forte, cego e tenso, fez saber
Que ainda era muito e muito pouco.
Faço nosso o meu segredo mais sincero
E desafio o instinto dissonante.
A insegurança não me ataca quando erro
E o teu momento passa a ser o meu instante.
E o teu medo de ter medo de ter medo
Não faz da minha força confusão.
Teu corpo é meu espelho e em ti navego
E eu sei que a tua correnteza não tem direção.
Mas, tão certo quanto o erro de ser barco
A motor e insistir em usar os remos,
É o mal que a água faz quando se afoga
E o salva-vidas não está lá porque não vemos.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Jimi's Illusion


                Enquanto tocava sua guitarra, Jimi lembrava cada momento da sua vida. Desde o primeiro beijo até o último cigarro. Era isso que o fazia tocar cada vez melhor. De vez em quando sofria de surtos e tinha ilusões, em uma delas, ele encontrava uma jovem garota, pálida e de cabelo curto, que sorria pra ele, por trás das árvores, e o convidava a entrar na floresta. Jimi sem hesitar correu a encontro da garota. Ela desaparecia e reaparecia entre as árvores, sob a luz de uma grande lua. Corriam e sorriam, e não se cansavam. De repente ela parou, de costas pra ele e começou a rir enquanto acendia um cigarro. Olhou para ele. Seus olhos penetrantes eram de um vermelho vívido, e pareciam atravessar-lhe a alma. Chegou mais perto dele, que já não se movia, e nem queria se mover. Ela soprou a fumaça dentro de sua boca e Jimi sentiu se queimando por dentro. Ela falou “não me deixe ir outra vez” foi então que ele lembrou quem ela era. Sim, seu primeiro beijo. Há tempos não se viam. “Você quem foi embora, lembra?” Uma lágrima descia pelo olho dela, que disse, com penar: “só porque você não me pediu pra ficar.” Afundando em lembranças, Jimi lembrou as últimas palavras que disse pra ela: “Vai mesmo? Finalmente.” Sim, poderia ser só brincadeira, e foi, mas só pra ele, e sem nenhuma graça pra ela. Ele certamente gostaria de voltar o tempo e tê-la pedido pra ficar. “Então, Jim, agora eu te peço pra ficar.” Enlaçando suas mãos na cintura fria dela, ele a beijou, sentindo o hálito frio percorrer todo o seu corpo...
                O corpo dele foi encontrado jogado aos lobos, mas seu espírito continuava correndo junto com a garota, entre as árvores da floresta.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Clair


 Ela caminhava na estrada de terra. Seu último cigarro na boca, o vento soprando, levando seu cabelo, recém cortado por ela mesma, acima dos ombros. Não tinha ficado tão bom, as pontas estavam erradas, mas ela não ligava. Não havia mais ninguém por ali que ainda se importasse. As folhas das árvores caíam. Era Outono, e ela queria alguém pra abraçar. Há dias não voltava pra casa. Na verdade, sua casa agora era onde ela conseguisse deitar e dormir, mesmo que por três horas. Seus olhos eram de um castanho claro que encantaria qualquer um, mas ela não gostava de olho no olho. Não queria garotos apaixonados atrás dela. Gostava muito da Cyndi Lauper, que cantava 'girls just want to have fun'. Só queria sair pra se divertir a noite inteira e dormir no primeiro colchão que visse. Adotara um caminho em que ela ditava regras e só ela saberia o caminho de volta. Era o tipo de garota que homem nenhum tentava botar laço.
 Soprou a fumaça pra cima, e uma gota caiu na sua testa. Lembrou do último cara que beijou - sim, ela ainda lembrava - era um rapaz bonito, cabelos loiros e face pouco arredondada. Ele a tocava com intensidade, e ela retribua, com beijos "calientes" e rápidas trocas de olhares, inconscientes da parte dela. Seus corpos se mexiam num vai e vem de pernas e braços e bocas... Um fervor subia nos dois enquanto um e outro cigarro era aceso e tragado até o fim e doses de Roth California eram viradas num só gole. Entre unhas e dedos, marcas eram feitas em todo o corpo do homem branco e quase sem pelos e quase sem músculos. Seus lábios se tocavam com mais força a cada encontro. Ela tentava mas não conseguia não olhar naqueles grandes olhos escuros, que sempre procuravam os dela naquela bagunça.
 Voltando ao presente, seu corpo já estava encharcado e ela nem percebera. Avistou uma casinha ali perto, onde não parecia ter ninguém. Entrou lá, tirou sua roupa, deixando à mostra sua tatuagem - um valete - e deitou na primeira cama que viu.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Um curto diálogo

   
      Audri era um jovem britânico, que gostava de caminhar entre os bosques floridos de Liverpool. Curtia os Beatles e os Rolling Stones, bandas famosas até hoje. Bonito e de média estatura, não era forte, mas tinha um charme impecável. Cabelo loiro e olhos claros, chamava atenção de muitas garotas. Não todas, mas muitas. Gostava de shows e de bebedeiras, e também fumava. As pessoas que andavam com ele eram iguais a ele, mas diferentes do resto. A mãe morrera há dois anos, câncer pulmonar. O pai não assumir, fugira um mês antes de ele nascer. Desde a morte da mãe ele vem arrumando trampos por aí e também recebe uma ajuda do tio. Ajuda essa que paga sua casa e suas bebedeiras. Tinha o quarto rodeado de vinis clássicos.
      Um dia, enquanto fumava na praça, um senhor de chapéu e sobretudo sentou no mesmo banco que ele e tirou um saco de um dos bolsos. Jogava pedaços de pão pros pombos que ali estavam.
      - Sua mãe não te disse que fumar não é bom pra saúde? - disse o velho.
      Audri olhou de lado e disse:
      - Minha mãe quem me ensinou a fumar, senhor.
      O velho, depois de uma risadinha, disse:
      - Eu nunca fumei na vida.
      - Foi porque sua mãe não te ensinou, senhor. - disse o jovem - Minha mãe dizia que quando as mães ensinam, os filhos nunca esquecem.
      Olhando distante, o velho perguntou:
      - Onde está sua mãe, meu jovem?
      - Morreu há dois anos, senhor, - disse o garoto, rindo amarelo - câncer no pulmão. E a sua, senhor?
      - Morreu há dez. Ataque cardíaco. E o seu pai, onde está?
      -Não tive pai.
      O garoto, terminando o cigarro, levantou e pegou uma rosa.
      - Senhor, pegue e cuide dessa rosa. - entregando-a ao velho - Daqui a dois anos, quando eu morrer, quero que o senhor coloque essa, e somente essa rosa, dentro do meu caixão.
      - Como assim filho? É mais fácil eu morrer antes que você nesses dois anos. - disse o velho.
      - Não, senhor, - falou o jovem, sorrindo - o senhor não vai morrer primeiro.
      - E como podes ter tanta certeza? - disse o velho, abismado com o que dizia aquele jovem.
      - É porque, senhor, - fez uma pausa - sua mãe nunca te ensinou a fumar.
      Dizendo isso, Audri pegou outro cigarro e o acendeu, enquanto caminhava, seguindo seu caminho. O velho ficou encantado com as palavras do jovem. Pegou seu saco de pão, que tinha caído, levantou e foi para casa, cuidar da pequena rosa.

terça-feira, 20 de março de 2012

Anne & Sith


No começo eu estava com medo de que ela me visse. Por isso pus uma máscara, e a coloquei na cama, amarrada pelos membros. Seus olhos de pavor me davam uma tranquilidade enorme, e seus suspiros me faziam esquecer do mundo, como se lançassem em meu corpo doses de endorfina. Sua pele branca, lisa, encantava-me a cada dia, enquanto aos poucos eu a pintava de vermelho. Não a privava de sono ou comida. Depois de uns tempos a gente já conversava: ela me perguntava o porquê de eu tê-la pego, e eu respondia sempre o mesmo: eles disseram que era você... Eu a cortava devagar, era prazeroso sentir a lâmina descendo por sua perna, pintando todo o branco de vermelho. No início eu a deixava lá, sangrando por horas. Mas depois de um tempo, olhando pros seus olhos escuros que, não demonstravam mais nenhum pavor, não senti mais essa necessidade de ver os pingos de sangue caindo da perna dela, e passei a tratar. Por alguma razão eu me sentia diferente com ela. Lavei seu rosto e limpei as feridas que foram abertas por mim. Não usava mais máscara, agora eu me sentia bem, e conversava com ela. Mas eu não cheguei a pedir desculpas. Ela me olhava estranho, não parecia sentir ódio. Eu a desamarrei, mas ela não quis ir embora. Parecia agora querer ficar ali, comigo. O que eu não entendia, já que no início ela estava tão horrorizada. Ela tocou meu braço, e o percorreu com seu dedo. Ela pegou a faca e traçou uma linha em meu braço. Como se soubesse, e logicamente sabia, o que eu sentiria, sorriu. No momento em que a lâmina descia meu braço, eu me senti bem. A dor era prazerosa. Então ela me deu a faca, e estirou a outra perna. Desci a faca, devagar, observando o sangue escorrer. E sua face era de uma tranquilidade comparada à minha, e não se via nenhuma dor em seu rosto, nenhum sinal de sofrimento. Foi aí que eu percebi, que ela era igual a mim.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Na cabana


Amanheceu chovendo. As lágrimas de Cook desciam e se confundiam com os pingos da chuva. Ali em frente, naquele caixão, estava garota que ele amou e disse que protegeria sempre. Sua cabeça estava nos momentos que eles passaram juntos. Não importava quais fossem: brigas, noitadas, risadas. Eles sempre davam risada no final. Ele não sabia quando encontraria alguém como ela. Radiante, sensível, forte. Gostava de ir à shows de rock com ele. Uma vez, lembrava ele, eles estavam voltando de uma dessas noites, entraram num barracão, já estavam bêbados àquela hora, e subiram num balcão, onde começaram a cantar e dançar, até que o dono do lugar chegou, e os colocou pra fora. Saíram correndo e rindo, ele com um litro na mão, talvez até seco, não perceberam, e foram direto pra cabana deles. Era um lugar onde só eles tinham a chave, onde se sentiam seguros e livres da pressão do mundo lá fora. Ela sempre dizia que, quando eles não pudessem mais se encontrar, deixaria a chave onde lembrasse dela, pra que ele não a perdesse.
Cook virou e correu para o lugar que sabia que poderia sentir que estariam juntos sempre. Colocou as mãos nos bolsos e sentiu uma pontada no peito: notou que havia perdido a chave e não conseguiu entrar. Suas lágrimas, que já haviam secado, voltaram a cair. Mas então ele ouviu a voz dela na cabeça, dizendo que a chave estaria onde ele lembrasse dela. Olhou pra cima, e lá estava, pendurada num prego atrás de uma ripa, a velha chave da cabana. Ele levantou e pegou a chave, abriu a porta e entrou, deitando num sofá velho que eles tinham arrumado por aí. E então, sentindo ali o cheiro dela, fechou os olhos e dormiu, sorrindo.

sábado, 10 de março de 2012

Você de ontem.


Ah, como gosto de você
Não. Não você de antes
Não você que me usou,
que me abraçou enquanto
beijava outro por minhas costas...
É alguém melhor que você!
Alguém que tem olhos sinceros.
Olhos que ainda contam histórias
Não como esses teus falsos olhos,
que de certeza só me passam
dúvidas, agora.
Você de ontem, você já se foi de mim.
O você que está aqui é um novo,
um você do presente
Um você presente.
Não é você
Esse outro
você.
É um você que
valerá a pena
o novo eu
que vou
ser.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

No Parque de Gramado


Will e seus dois parceiros, Kipp e Ronnie, estavam atrás de um caso estranho que acontecera em Gramado...
"Há 50 anos, um grupo de adolescentes, que acampavam num parque, invocavam espíritos durante a madrugada. Assim que os espíritos apareciam, caíam numa armadilha feita no local de invocação, e eram torturados pelo grupo, que pelo visto, conhecia bem os rituais e as formas de tortura utilizadas. Mas, talvez em um momento de distração, parecia que um deles não tinha sido preso, e começou a assombrar todos ali. Janelas quebravam sem nenhum motivo plausível, vozes eram ouvidas ao longe, num grito de desespero, e alguns deles viram dois pés atravessarem a parede de um dos quartos do acampamento. Além disso, alguns jovens não acordavam mais, era um horror vê-los mortos em sua própria cama..."
No Rio Grande do Sul, Will e seus amigos estavam indo atrás da única jovem que sobreviveu. O seu nome era Hilda. Eles procuraram uma amiga que também morava lá, Giovanna, para ajudá-los a achar a casa dela, e também o parque da cidade. Junto com ela, encontraram um mágico, que fez uma exibição grátis a eles, e disse que só havia um parque por ali, e que não era bom visitá-lo, pois nem sempre todos que iam, voltavam. Mesmo com o alerta, eles queriam descobrir o que havia realmente acontecido. Eram céticos à aparição de fantasmas, espíritos, deuses... E queriam provar que tudo não passara de uma farsa. Entraram no carro do homem e seguiram até a casa da Hilda, onde iriam encontrar duas meninas: sua filha e neta. Quando chegaram lá, nem precisaram bater no portão, uma garotinha loira e de cabelo cacheado saiu, com uma sacola na mão, e a deixou no canto da calçada. Entraram e viram uma mulher de cabelo preto. Perguntaram a ela se a dona da casa estava lá, mas nem foi preciso, a velha apareceu na porta e os convidou pra entrar. Ela contou toda a história, mas mudou em um ponto, que era interessante: havia um cara que não fazia parte das reuniões noturnas, e ficava só de longe, olhando tudo. Ele se chamava Theodore, mas todos o chamavam de Ted. Usava óculos e tinha um pequeno kit de mágica, era o mais afastado da turma. Will então pediu que a senhora os levasse ao parque, onde eles acampavam, mesmo que estivesse abandonado. Ela concordou, relutante, e entrou no carro. Os meninos entraram no carro do tal mágico, e seguiram o da velha. Embora o mágico também conhecesse o lugar, não falou nada, apenas dirigiu.
Ted lembrava das noites de lua, onde os outros amigos se reuniam pra chamar as aparições na madrugada. Ele nunca acreditou nisso, porque ele sabia o que realmente estava acontecendo. Sua irmãzinha tinha uma certa habilidade de criar cenas a partir de uma história que lia, e era apaixonada por histórias de terror, que ele sempre lia pra ela toda noite, antes de dormir. Mesmo inconsciente, ela conseguia criar situações inusitadas, com qualquer criatura que estivesse em sua mente. Mas com um tempo a situação ficara fora de controle, e os jovens estavam morrendo, misteriosamente, na própria cama. Foi então que ele resolveu parar e sair dali com sua irmã, sem ninguém perceber. Quando soube que os garotos estavam desconfiando da história, fez uma lavagem cerebral na irmã, que esqueceu de tudo que aconteceu.
Voltando a realidade, percebeu que já haviam chegado ao lugar onde tudo começou. Saiu do carro e seguiu a velha, que andava em direção aos quartos abandonados que ainda tinham as marcas do passado: as mesmas janelas quebradas, as marcas feitas no chão e teto. Eles vasculharam os quartos atrás das evidências, mas tudo que encontraram foram livros de fantasmas e gramas de pó dentro das gavetas: "Sei não Will, mas eu acho que esses caras eram todos chapados!" brincou Kipp, apontando para o pó que tinha achado na gaveta. "Não, mas eles não cheiravam nada." retrucou o Ted. "Como você pode saber? Não nos contou que esteve lá." o mágico sorriu amarelo e disse: "Eu também ouvi as histórias, sabe como é, a que todos contam, e nenhuma dizia que eles cheiravam..." Will agora desconfiava do mágico. Por que ele defendeu assim os garotos? Ou será que ele defendia a tese de os espíritos realmente terem aparecido? E as dúvidas só aumentavam...
Giovanna olhou em volta, aquele lugar lhe era familiar. As árvores, o cheiro da terra e das folhas, o vento que levava seu cabelo escuro... Estava tendo flashes de memória, onde via um quarto e um garoto. Procurou esse quarto, até que encontrou, e viu os livros que seu irmão, imaginou que seria ele o garoto, lia pra ela antes de dormir. Abriu o livro perto da metade, e começou a ler. Subitamente, tudo ficou escuro, as nuvens ficaram pesadas e uma onda de terror atingiu a velha, que olhava pro céu pedindo perdão aos espíritos que foram torturados antigamente. O que sobrou das janelas voltou a quebrar, mas então eles ouviram um grito fino, vindo de um dos quartos. Era Giovanna. Correram para lá e logo entenderam o que acontecia. Fecharam o livro e os olhos dela, e tudo voltou ao normal. Kipp a pegou nos braços e a deitou na cama, dizendo pra ela se acalmar. Will saiu em disparada, vendo que Ted estava fugindo. Como tinha um porte atlético, foi fácil chegar até o mágico e derrubá-lo com a força do corpo.
Quando tudo foi esclarecido, Ted foi culpado pela morte dos jovens e por ter omitido a história toda. Giovanna se desculpou com Hilda, que estava abismada com tudo aquilo. Tudo não passou de cenas criadas pela garota, que só agora reconhecia seu dom. Kipp a convidou para sair qualquer dia desses, e ela aceitou, com um sorriso amigável. E então os três amigos voltaram pro apartamento, onde encontraram um recorte de jornal, que dizia: "Caso misterioso de morte em Equinox...", eles se entreolharam e deram um meio sorriso.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Ares de Fogo - Parte II


Ele lembrava do sorriso dela enquanto enviava aquela mensagem. Ficava imaginando o quanto seus olhos brilhariam, já que os dele também brilhavam. Aquela voz macia, que sempre o acalmava no simples dizer de um "oi". "Posso não ter beijado todos os beijos, mas o seu é o que mais me chama, sua intensidade é imensa. Como um ímã, tu me atrais e me repulsas, pólo a pólo. Sua pele, ah, tão limpa e lisa, dá-me vontade de deslizar sobre teu corpo branco, quase pálido. Logo, logo estou voltando para te abraçar e te fazer cafuné. Eu sei o quanto você gosta... Ah, menina, não sabe o quanto te desejo..." enquanto isso os pingos de chuva caíam lá fora, lavando as janelas e as ruas, e levando a saudade, que aumentava a cada lembrança daqueles lindos olhos castanho-escuro. Ele então ligou o som, que tocava agora uma melodia suave, e, em seu pensamento, acompanhava a bela moça em uma dança. E a chuva lembrava ela, e a música lembrava ela. E naquele momento, era ela só o que ele queria tocar. Queria cheirar seus cabelos pretos, olhar no fundo daqueles olhos e dizer a única frase que ela, ele estava certo, queria ouvir: "eu te amo".

Ares de Fogo

  
Ela caminhava na rua fria, com pouca iluminação, lendo a mensagem que chegava no celular. Seu cabelo, liso e escuro, esvoaçava numa brisa que se transformava, aos poucos, em vento forte. Seus olhos castanho-escuro desciam aquela mensagem, enquanto das nuvens caíam os pingos de chuva. Não, ela não correu e nem quis se abrigar embaixo de alguma varanda. Deixou a chuva cair e molhar sua roupa, sua pele branca... A blusa preta encharcada dava ênfase a seus seios, que mais pareciam duas pequenas maçãs. Caminhava contra a chuva, vez em quando dava voltas, dançando sob a água, que caía com força. Festejava! Talvez a liberdade que naquele momento sentia. Também tinha a felicidade daquela mensagem, que a fazia sorrir só de lembrar. Ah, aqueles dígitos lembravam a voz dele. E tudo que ela gostava de ouvir estava alí, ecoando em sua mente, encharcando sua alma, assim como fazia a chuva em sua roupa. Seus, refiro-me novamente, de um castanho-escuro, estavam radiantes e cheios de lágrimas: de alegria, emoção... Ah, seu sorriso de aparelho era o mais lindo de todos naquele momento, onde nem o frio ou a chuva poderíam resfriá-la por dentro, já que ela era puro fogo!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

UFPB, aí vou eu.

Galera que segue o blog, só pra informar por aqui que eu passei no vestibular, pro curso de Jornalismo, na UFPB. Novos ares irão, sem dúvida, dar-me novas inspirações, temas e novos textos. Agradecer o apoio que vocês sempre me deram aqui, comentando, divulgando e visitando o blog. Estou muito feliz em ter entrado, mesmo pela segunda chamada, estou dentro, é o que importa. Só deixando aqui essa ótima notícia, nesse meu blog novinho, que faz três anos esse ano. Valeu pessoal, até o próximo post.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Uma última lágrima

   
   Na Floresta do Leste, a luz do luar era soberana. Não havia no céu nenhuma nuvem que a fizesse sumir. Seu brilho era forte e intenso, e junto com a brisa da noite, deixava um ar sombrio. Clara passeava por entre as sombras daquela noite, enquanto sentia um vento bater no seu rosto. Seus pensamentos voavam junto com as corujas que piavam por lá. Sua pele era de um branco pálido se destacava nas sombras, quase fazendo inveja ao luar.
    Olhando as formas das nuvens, viu a silhueta de um rapaz, que estava de costas para ela, contemplando a lua.  Então, na cabeça dela, veio a imagem de um garoto branco, pouco mais alto que ela. Ele virava o rosto e ela se encantava com aqueles olhos castanhos vívidos. "Vem aqui", dizia o rapaz com a mão estendida, convidando-a a juntar-se a ele. Ela estava tão encantada com aquela imagem que não percebeu quando todo o céu, de repente, escureceu. Correu para segurar a sua mão, sua perna se enroscou numa raiz - a realidade tentava fazê-la despertar - mas ela se soltou e voltou a correr. Caiu muitas vezes, arranhou-se em troncos de árvores e sangrava. Mas mesmo assim ela sorria. Sua pele ficava vermelha escura, a cada queda, a cada gota de sangue que caía. Chegou à ponta de um penhasco, de onde saltou, buscando a mão do rapaz que ainda estava ali.
    Caindo do penhasco, ela se viu nos braços frios do garoto que a chamou, e continuava sorrindo. Seu corpo rolava montanha a baixo e batia nas pedras, até que enfim parou de rolar. Na sua boca, um último sorriso. No seu olho, uma última lágrima.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Complica a ação

  Juazeiro do Norte, CE 06/02/2012

      Querida J...

      Quanto tempo nós passamos sem dar ou receber respostas definitivas? Principalmente por minha parte, que nunca consegui dizer, diretamente, se queria ou não você. Sempre criávamos alguma desculpa para encobrir a verdade. Mesmo que ela estivesse quase por sair, assim, de supetão, havia sempre alguma frase, alguma explicação ilógica para disfarçar e sair de perto. Mesmo que nossos olhares dissessem palavras verdadeiras, as mesmas não eram ditas por onde deveriam ser. Deveria, e eu acho que é muito simples, dizer um sim ou um não, mas a gente é que complica. Sempre queremos colocar alguma dificuldade, alguma barreira que fique ali. E quando ela está prestes a desmoronar, quando estamos decididos a contar um pro outro a verdade, o corpo gela e colocamos mais tijolos e cimento nesse muro que complica a ação de assumir, de aceitar... Peço-te desculpas por nunca ter te dado uma resposta definitiva, e por também não ter te cobrado uma decisão. Eu sei que às vezes você só estava esperando por mim, por eu dar o primeiro passo. Acredite, eu já tentei, mas sempre exijo uma barreira pela qual eu não consiga ultrapassar, uma zona de conforto, onde eu possa não sair ileso, mas é impossível. Não tem como não se machucar sobrepondo aquilo que sente com situações que nem sequer existem. 
      Por fim, acho que seguiremos assim, com as mesmas histórias e estórias que conseguirmos criar, a fim de evitar o que possa acontecer entre a gente.

Receosamente,
Kilder Kavalcante

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Para um alguém



 Parece que quanto mais eu tento me aproximar de você, tento falar com você, a gente se distancia mais. Embora eu tente sempre te dizer qualquer frase que seja, parece-me que você não quer saber, não se interessa no que tenho a dizer, a fazer, a mostrar... Só queria que você me olhasse. Uma só vez. Visse-me por dentro, por inteiro, e então saberia o quanto eu te quero aqui perto de mim. Não só como um cara que te quer hoje e amanhã quer outra garota. Eu te quero e te espero, mas não sei o quanto mais vou esperar. Só sei que se demorar muito, eu posso não querer mais, e aí sim, quando isso acontecer, é que você vai vir me dizendo que também quer, que também sente o mesmo, que não aguenta mais ficar longe de mim. E eu sei que, por mais que meu corpo diga que sim, vou treinar meu coração pra te dizer não, porque não é quando um desiste, que o outro começa a querer...