sábado, 22 de fevereiro de 2014

Refúgio


  Chove na cidade grande. As luzes que enfeitam as ruas e prédios vão se embaçando cada vez mais sobre a lente dos meus óculos. Minha camisa está encharcada e quase não sinto meus pés dentro do tênis gelado da água da chuva. O vento sopra contra mim, fazendo os pingos baterem com mais força em meu rosto, levando todas minhas preocupações, todo o meu cansaço e lavando minh'alma com sua pureza.
  Lembro daqueles dias onde tudo era mais fácil, em que não se precisava de muito para ser feliz. Era tão bom ser criança e eu não sabia, ou preferia não saber. Ansiava pela idade adulta, pelos tão sonhados 18 anos, imaginando que tudo estaria ao meu alcance, ah!, sonho de infância. Não é lá essas coisas entrar na fase adulta da vida, não. É tudo cansativo, mas essa chuva me alivia, leva o meu cansaço, esconde a mágoa e a tristeza que está descendo dos meus olhos, procurando o asfalto da rua.
  Caminho enquanto a chuva vai caindo e poucos, na verdade quase nenhum carro me olha com seus fortes faróis, tirando-me dos devaneios e lembranças, jogando-me de volta àquele mundo, esse mundo há muito estragado por todas as pessoas, inclusive por mim. Ando procurando aquele refúgio que sempre tinha enquanto criança, aqueles braços que me acalmavam depois de pesadelos, ou quando eu caía na rua, jogando futebol. Acredito que todos, pelo menos uma vez, desejaram esse refúgio.
  E a chuva não para...

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Algo fora da proposta do blog

No final do ano passado eu escrevi uma crítica pra cadeira de Estética e Linguagem do Audiovisual, de, é claro, um projeto audiovisual. Escolhi uma cena da série norte-americana da HBO "Carnivàle" que infelizmente só teve duas temporadas e foi ao ar entre 2003 e 2005.
Não vou contar a sinopse aqui, quem quiser procura depois que aqui nunca foi de ter isso. A cena se passa em pouco mais de um minuto e se trata de um monólogo de um dos personagens principais de toda a trama: um dos donos do circo 'Carnivàle', Samson, interpretado pelo Michael J. Anderson. Por ser a primeira crítica que fiz, fiquei feliz com minha nota (foi 8). Sem prolongar mais isso, eis aqui a tal crítica.

             "A cena analisada foi filmada em primeiríssimo plano, com posição frontal e angulação normal. A escolha destes componentes para criação do ato se dá primeiramente por uma relação de intimidade que o diretor procura criar entre o personagem e o seu espectador. É a introdução do que está por vir.
            Procura-se nessa cena, onde a câmera é colocada em frente ao ator, criar um momento ‘cara a cara’ com o personagem, criando assim um clima dramático, um pouco puxado para a tensão. Quem não fica tenso quando sente alguém tão perto? É como se um segredo estivesse para ser revelado, fixando quem assiste, a fim de mantê-lo preso até o fim, atiçando a curiosidade.
            Esse clima olho a olho que é criado a partir do posicionamento e do plano utilizados gera a sensação de algo muito sério e até fantástico está por vir. A iluminação vinda de cima para baixo, deixando pontos do rosto mais escurecidos que outros, dá um efeito de mistério, que se atenua a cada fala do personagem, o qual já foi dito, constrói uma relação de intimidade com seu ouvinte, convidando-o por meio do plano pelo qual é composta a cena.
            Outro motivo pelo qual este foi o melhor modo de gravar a cena em questão é o sentimento de imersão causado pela junção da fala mais os componentes da cena: fundo preto e luz fraca, trazendo um clima de reflexão. O diretor escolheu esta combinação para demonstrar um pequeno mergulho no mistério de toda a trama, estimulando a curiosidade já grande das pessoas, sem, no entanto, apelar. Desse modo, procura prender o espectador usando nada mais que um monólogo introdutivo, mas cheio de mistério e drama.
            Ao fim da cena, após alguns minutos de calmaria e tensão, onde a posição da câmera faz com que o personagem olhe nos olhos de quem assiste, há uma ruptura, um corte brusco naquele momento de intimidade, usado para imitar um acordar de um sonho, uma volta para a realidade, é como um despertar."