quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Dois amores

"O que foi que te aconteceu?" Pablo estava ofegante enquanto seus olhos miravam o espelho, o sangue que descia de seu lábio inferior. Ao seu redor os móveis estavam todos espatifados, e se via aqui e ali pedaços de papel: cartas rasgadas na ira de alguém. Mas o espelho à sua frente continuava intacto. Talvez para que, em um relance de luz, ele se enxergasse por um minuto e tentasse explicar e entender de si mesmo qual o motivo para toda aquela raiva. Mas não, ele não tinha certeza nem de porque estava ali: sentado sobre cacos de vidro de algum copo que foi jogado ao chão ou à parede com força. "Por que está agindo assim, bebê?" Mas ele não sabia. Não conseguia encontrar nenhuma razão para aquilo tudo, nem mesmo se era ele quem tinha feito aquilo. "Quem mais poderia ter feito, querido?" Ele mal conseguia se olhar no espelho. Seus olhos não eram mais seus, estavam diferentes. Suas mãos ainda tremiam e tinham pequenos cortes, talvez do vidro ou do papel, quem sabe? Olhava a sala de canto a canto, tentando lembrar se em algum momento tinha-se cortado, ou se realmente teria feito aquilo. Não lembrava nem mesmo de estar em casa. "O que é isso no seu olhar, amor? Olho-te nos olhos e só vejo rancor. Você ainda me escuta? Ainda presta atenção em mim?" Pablo conseguia sim ouvir, mas só prestava atenção no que havia feito. Sim, só podia ter sido ele: estava sozinho em casa, e foi encontrado sozinho. Na parede, agora ele notara nela, havia um nome escrito: "Afonso... Por que escreveu o nome dele aqui? Foi ele a causa disso tudo?" Pablo não lembrava que tinha escrito ali o nome, mas talvez fosse dele a culpa. "Eu sei que ele se foi, meu amor, mas eu estou aqui com você. Agora." Mesmo assim, não se podia dizer ao certo o que provocara aquilo tudo, e nem ao menos como o nome apareceu ali. "Por que rasgou as cartas que te fiz?" "Eu não sei..." Enfim Pablo recuperou a voz, mas só conseguia repetir a mesma frase sempre: "eu não sei, eu não sei..." Afonso fora um grande amor de Pablo, mas há um ano havia partido. "Foi ele?" Talvez possa realmente ter sido ele a razão daquilo tudo. Mas quem sabe como? "Vem cá, bebê, não vou deixar mais ele te incomodar." E Pablo se enroscou nos braços de Carlos e repetia com a voz pesada de choro "eu não sei... Eu não sei..." até adormecer no embalo dos braços de seu protetor.

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