sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Fora da maleta

     Jonas corria na escuridão sob a chuva fina que caía quente. Com uma maleta em mãos, nem sequer olhava para trás, com medo de ver os olhos brancos que o perseguiam desde que saíra da escola, horas atrás.
     Quando recebeu a maleta e aceitou carregá-la até o endereço destinado, não imaginou que seria perseguido ou correria algum risco. "Dentro desta maleta mora o segredo da vida" disse o homem vestido de branco, quando confiou a maleta a Jonas, "somente quem é digno e de consciência limpa conseguirá entregá-lo ao destinatário e ver o que tem dentro dela." Ah, pobre Jonas. Esse é o mal de todo ser humano: sempre se acha digno de alguma coisa neste mundo.
     As palavras do homem pareciam tomar todo o pensamento de Jonas, enquanto sua respiração pesada tentava abafar aquela voz rouca. Durante o percurso, lembranças vinham à tona e Jonas se assustava com elas. Eram todas as vezes em que ele machucara as pessoas que o amavam. Pessoas talvez até mais hábeis que ele de carregar a maleta. E a cada lembrança os olhos brancos se aproximavam.
     Repentinamente, Jonas parou. De olhos fechados e assombrado pelas memórias, soltou a maleta e esperou ser pego pelo que fossem aqueles olhos brancos. Quando os abriu de novo uma imensidão de branco o rodeava, quase cegando-o, e, a alguns metros, lá estava o homem de branco, olhando para Jonas. E por toda a extensão de branco outras pessoas também o olhavam. Jonas se aproximou do homem e perguntou o que havia dentro da caixa. Sorrindo, ele respondeu: "Por que acha que estamos todos aqui? Ninguém nunca foi capaz de entregar a maleta. Todos se acharam dignos, puros, mas ninguém quis enxergar os próprios erros até que esses foram jogados em nossas caras. E muitos ainda tentarão, e muitos mais falharão. Até que ninguém mais se preocupe em descobrir esse segredo. E então, só aí, ele se revelará ao mundo."

Nenhum comentário:

Postar um comentário